domingo, 27 de novembro de 2016

III – de como os mais pequenos se tornam grandes e balsâmico é o desejo de voltar a casa

Neste blogue praticam-se a Liberdade e o Direito de Expressão próprios das Sociedades Avançadas

A saga de Brama espalhou-se rapidamente pelas aldeias e se uns ironizavam, afirmando que um veado sem hastes não é um veado, outros desejavam ardentemente que Brama ganhasse coragem, enfrentasse as montanhas e libertasse Timóteo. Entre estes últimos encontrava-se o rapaz mais pequeno da aldeia, o mais tímido, o mais pacífico. Chamavam-lhe Lunar porque tinha nascido entre a lua cheia e o quarto minguante, quando balsâmica é a lua. Do seu verdadeiro nome já ninguém se recordava e Lunar era lunar, o rapaz calado, curioso, que sabia a ciência dos bichos e das plantas.
O rapaz possuía um esquilo voador, pequenino, tímido e pacífico como ele. Por isso pasmava com a fama de Perfidus e dos seus filhos, com a maldade das suas ações. Bem lá no fundo acreditava que alguém ou alguma coisa os tinha tornado assim.
E sonhava com a tristeza de Brama no sopé do monte e com Timóteo, prisioneiro na terceira das torres, aquela que ninguém via. Depois teve uma ideia que considerou genial e disse ao avô:
- Se ateassem fogueiras pelas montanhas acima, talvez Brama subisse e quem sabe…
O avô juntou os homens da aldeia e em cada pequeno planalto fizeram uma fogueira e se a neve era fria, não parecia, e nos olhos do veado brilharam labaredas cor de fogo e à medida que subia, as hastes começaram a crescer e a meio da montanha já lhe pesavam. Chegado ao topo, Brama era um veado adulto e as galhadas na sua cabeça eram as mais belas que alguma vez alguém vira. Foi então que avistou a terceira das torres, invisível para os olhos humanos mas percetível para os seres que têm bom coração. Soube que era ali que Timóteo estava cativo. Mas uma pesada porta guardava a fortaleza e não seria assim que lhe permitiriam entrar. E escondeu-se atrás de uma rocha.
Então o rapaz enviou o seu esquilo voador pequenino e tímido como ele e este bateu na ferragem da porta. Do lado de dentro ouviu-se uma voz:
- Quem és, o que queres?
- Sou um esquilo voador que perdeu o caminho de casa. Venho prestar vassalagem ao meu rei – respondeu, abismado com a ousadia.
Os de dentro, cedendo à vaidade e à cobiça e desejosos de acrescentar mais um ao seu terrível bando, abriram a pesada porta. O esquilo voador avançou e logo atrás dele surgiu Brama e as suas enormes hastes. E bramindo, investiu contra Perfidus e os filhos. Contam alguns que o esventrou, outros que o baniu para sempre das montanhas, outros ainda, que lhes perdoou e redimindo, se redimiram.
Juntamente com Timóteo, cujos dentes da frente tinham o comprimento de vários paus de canela, tal foi a fome que passou, foram libertados dois lobos, quatro coelhos, cinco esquilos comuns, dois castores, uma truta, um urso, um homem, três mulheres e duas crianças.
São assim as lendas. A verdade dos factos mistura-se com a imaginação e lunar é o rapaz balsâmico que possuía um pacífico esquilo voador.
Na aldeia, guardaram-se as nozes para os bolos de mel e as bagas de azevinho rebentaram entre as folhas de um verde muito escuro. Cheirava a húmus e a pinheiro manso e o fogo crepitava nas lareiras.
Foi então que Brama sentiu um apelo, um chamamento dos outros veados. Agitou as hastes, baixou a cabeça, raspou a terra com as patas dianteiras. E se era dezembro, era o tempo de regressar a casa. 
 
 

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