domingo, 2 de dezembro de 2012

laurus

Neste blogue praticam-se a Liberdade e o Direito de Expressão próprios das Sociedades Avançadas

Simplifico. Nada de mais falso a artificialidade das palavras.
Pegamos numa folha no sentido horizontal e com os dedos indicador e polegar rasgamo-la até ao pecíolo e debaixo de um jacto de água purificamo-la. Se a carne estiver lardeada, entalamos pedacinhos nos fios que a sustentam, um contacto íntimo, promíscuo, essencial para a libertação do aroma e do sabor. Mas se a nossa pressa for apenas vagar e o fogo médio, os sucos formam-se e jamais se desforma a folha. Depois é molhar o pão quente e escorrer brandura.
Vai-te embora passarinho, deixa a baga do loureiro, deixa dormir o menino, que está no sono primeiro.
Acrescenta-se o sal e a pimenta e as ervas de cheiro e o azeite está na natureza desta terra tão mal querida, desajeitada, ferida. Lágrimas de crocodilo diz-se de quem chora fingido. Chorar não ajuda nada. Ninguém muda o lugar onde nasceu, mas muda o destino ai sim.
Observo calada para não acordar os pés de salsa. Nada de mais belo, a simplicidade das folhas. Isoladas são insonoras, folheadas as árvores, copa frondosa vem o vento e são como a água, é só fechar os olhos e não saberemos nunca se é um regato, a chuva ou as folhas a contar viagens, as persistentes, de um só limbo ou de dois limbos o paraíso terreal é uma busca de séculos efetuada pelos homens que acreditam no seu próprio sonho. O de deus é para nós um sonho adiado infinita a sua misericórdia mas dura a sua travessia. Pergunto-me se um dia nos encontraremos os quatro, eu e deus e os sonhos de ambos. 
Se não caracterizamos falamos de quê, de que é que falamos. Laureado é aquele que colocou na cabeça uma coroa de louros, nós, uma coroa de mago.
Vai-te embora papãozinho e até o peixe ganha vida se acrescentarmos à água da cozedura uma folha das mais pequenas e soprarmos, navega, uma espinha é um mastro e tu, barco à vela, deixa as telhas do telhado, deixa dormir o menino um soninho descansado.
E se por um acaso o coração nos parar assim de repente sem o esperarmos nem tão pouco desejarmos é porque nos enganámos na folha e colhemo-la do loureiro-rosa, venenoso. Esta hipótese é apenas remota mas o perigo real.
Imagino. Nada de mais real imaginar assim. As folhas captam a luz e eu devolvo-lhes a sua própria vegetalidade.
Relato histórico é embalar um canto não te vás pássaro que o menino dorme papão é um país assustado nas telhas de um telhado. Negra é a baga e tranquilizadora a folha verde a que dei brilho silêncio e cor.

3 Responses so far.

  1. Pelas belas obras devemos ficar-nos pela contemplação.
    O meu vício, e é o problema da deriva crítica, mas é defeito profissional, quem me dera ser apenas leitor, dou nota máxima: "nada de mais falso, a artificilidade"... das críticas, e da soberba de quem pontua :-)

  2. ... e já que estamos numa de tertúlia literária, com muita gente a assistir, no outro dia, desmantelei/ámos, em Estética, um poema extraordinário da Sophia: "Quando eu morrer voltarei para buscar
    Os instantes que não vivi junto do mar"

    Fica aqui o desafio -- para os poetas e escritores deste espaço --, para fazermos o mesmo exercício :-)

    Realmente, quanto de Relvas o Futuro (não) reterá?...

  3. Tenho tomado a liberdade de inserir as hiperligações para os blogues pessoais da Manuela, já que esse é o espírito de rede, vizinhança e consonância artística

 
 

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