domingo, 24 de março de 2013

o coelho fica para jantar

 


Sentou-se no último degrau da escada e disse em voz alta, os pessegueiros estão em flor. Depois riu-se e a gargalhada foi pousar no muro do jardim entre a caixa do correio e o portão de ferro pintado de verde.
Sobre as pedras as lagartixas iam e vinham nervosas, a pele macia saudosa do sol, as mandíbulas ágeis prontas a enrolar insetos. E o coelho perguntou, estás a escrever um livro? Ela olhou-o serenamente na firme convicção de que se não todos, pelo menos os coelhos brancos tinham o dom da palavra e apanhou do chão o caderno de folhas quadriculadas. Por cima da sua cabeça e das orelhas espetadas do coelho, esvoaçou um bando de andorinhas e ela respondeu, escreve tu que és coelho. Na rua o alcatrão estalou e o coelho encolheu-se.
As flores do pessegueiro prometeram-lhe uma casca fina, uma polpa doce e sumarenta e um canto de páscoa quando o domingo chegar.
Por entre os dedos, as tocas dos animais de pelo curto escorregaram e o jardim calou-se à espera do anoitecer. Ela deu a mão ao coelho e entraram para jantar.



 
 

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